Comecei a ler "Caim" na viagem para Madrid e embora ainda esteja a um terço do livro, estou verdadeiramente surpreendida com o toque de leveza que desta vez penetrou a densa escrita a José Saramago nos tem habituado.
Desta vez o escritor soltou o seu lado sombrio e deu lugar a um humor que lhe era pouco habitual.
A história de Adão e Eva no jardim do Éden e a forma como o Deus omnipotente os expulsa do Paraíso é verdadeiramente hilariante e pode até ser a história de qualquer comum dos casais do século XXI.
Um facto curioso é que em nenhuma circunstância os sujeitos, tais como "adão", "eva", "senhor" ou "deus", são mencionados com maiuscula na primeira letra da palavra.
"Quando o senhor, também conhecido como deus, se apercebeu de que adão e eva, perfeitos em tudo o que apresentavam à vista, não lhes saía uma palavra da boca nem emitiam ao menos um simples som primário que fosse, teve de ficar irritado consigo mesmo, uma vez que não havia mais ninguém no jardim do éden a quem pudesse responsabilizar pela gravíssima falta, quando os outros animais, produtos, todos eles, tal como os dois humanos, do faça-se divino, uns por meios de rugidos e mugidos, outros por roncos, chilreios, assobios e cacarejos, desfrutavam já de voz própria. Num acesso de ira, surpreendente em quem tudo poderia ter solucionado com outro rápido fiat, correu para o casal e, um após outro, sem contemplações, sem meias-medidas, enfiou-lhes a língua pela garganta abaixo."
Giraça esta forma de conhecer a realidade do Paraíso... fiz as pazes com José Saramago e a sua escrita mais recente e, muito sinceramente, não consigo ver onde está a polémica.
Estes guardiões da moral e dos bons costumes são uns verdadeiros chatos!
Para além disso os deuses devem estar loucos, pelo menos cá pelas bandas da Portugalândia onde os Abéis do poder e da alta finança estão a deixar cair as máscaras, escondidas sob as asas do Querubim.
E tal como é referido na sinopse do romance é obrigatória a pergunta:
Quem diabo é este Deus que, para enaltecer Abel, despreza Caim?
Até ao próximo romance, José Saramago!
Beijos,
da Princesa
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